segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Abaixo às esteiras


Não gosto de esteiras. Hoje, minha caminhada foi nas ruas do meu bairro, sentindo o sol na pele e o vento na cara. Descobri muitas coisas que não via. Vi casas de todas as cores, grandes e pequenas, novas, reformadas, velhas, em ruínas.

Ah, e os jardins. Vi muitos deles, com flores de todos os tipos, rosas, alecrins, margaridas, tulipas, begônias, e outras tantas que não sei o nome. (Acabo de me dar conta de que não sei identificar os nomes de muitas flores, e isso é triste!).

Descobri, feliz, que no meu bairro as pessoas ainda cultivam flores e plantas. Senti muitos aromas. A despeito da verticalização do bairro, muitas casas ainda resistem, fortes, soberanas com suas varandas, redes e quintais.

Vi travesseiros e lençóis nas janelas para tomar sol, roupas nos varais e crianças brincando. Vi velhos nas calçadas. Lembrei da minha infância e do meu avô.

Também ouvi muita música que vinha das casas. E cheirinho de comida começando a ser preparada.

Vi contrastes grandes na arquitetura do meu bairro. Vi barracos e lindas casas planejadas. Vi uma pequena favela arborizada e grandes casas imponentes de cimento, concreto, mármore e vidros, porém, sem uma única planta.
Vi marcenarias, oficinas mecânicas, padarias, bares. Vi as pessoas que trabalham no meu bairro.
Interagi com as pessoas, umas me davam bom dia, outras só olhavam, muitos ignoravam. Mas, eu as via.  

Ah, vi também os animais. Cachorros, gatos, passarinhos. Ouvi seus sons... e seus silêncios. Vi suas grades. Sua segurança e sua prisão.

Amanhã, outros caminhos me esperam. E outras descobertas... que, da esteira, jamais me descortinariam.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Dois anjos


Admirável e estranho mundo novo. Duas mortes perto de mim na mesma semana. Ambas me chegaram pelo Facebook. “Dor sem fim”, dizia uma amiga que perdera a pequena filhinha ainda no ventre. “Um anjo subiu ao céu”, dizia outra amiga, sobre um amigo comum, ex-colega de trabalho, que partiu subitamente aos 23 anos de idade.

Nem telefonemas, nem visitas, nem velórios. Difícil compreender a morte, ainda mais quando ela não se materializa na nossa frente. Ainda mais quando é de duas crianças, uma que nem nasceu, e outra que tão pouco viveu.

De um, guardo recordações alegres, pessoa bem-humorada, chegava sempre sorrindo na redação e tinha uma piada e brincadeira pra tudo. Quietinho no início, foi ganhando espaço no trabalho e no coração de todos. Meu colega na ginástica laboral (ainda me perguntou quem iria cobrar que ele fizesse o chato exercício quando saí da empresa), e das pautas sobre celebridades, sempre com um comentário ácido e divertido.

Da pequenina, só sabia que era muito esperada e amada por seus pais, sua irmã, seus avós, parentes e amigos. Não pude ligar para sua mãe, não encontrei palavras, meu coração ficou calado, pois por quatro vezes senti o que ela sente agora. E, por quatro vezes, não soube, não assimilei, não registrei o que me disseram, o que ouvi, nem o tamanho da dor do meu coração. Por quatro vezes, na verdade, não queria ouvir nada. Muito menos dizer. Não havia palavra.

Ainda ficou um abraço, que quero muito lhe dar. Que está guardado no meu peito para quando pudermos nos ver. Não quero ir agora, porque sei que estará rodeada de pessoas, e que muitas vezes, só desejará o silêncio.

Não pude me despedir do meu jovem amigo, levado para perto da família numa cidade muito distante. Mas, pude vê-lo muito vivo nas fotos com os amigos, bonito, sorrindo numa mesa de bar. E também pude ver as inúmeras declarações de amor e amizade, e o pesar dos muitos amigos saudosos.

Em tempos de redes sociais, até a morte é virtual. Aliás, ela sempre foi, assim como a vida que achamos que temos nas mãos, mas nos escapa após um leve suspiro, que nos devolve para a nossa verdadeira existência. E essa, de onde estamos agora, não conseguimos enxergar.