domingo, 25 de março de 2012

Prata não!

Todas as manhãs eles estavam lá. Cada dia os via em maior quantidade, intrusos, rebeldes, sem convite ou permissão para ali estar.

Tesoura em mãos... e, com a minha pouca habilidade, acabava estirpando outros tantos que eu não queria, mas eu não desistia de me livrar deles... minuciosamente, cirurgicamente, quase que religiosamente.

Mas, dias depois, lá estavam eles, os mesmos estirpados e outros em outras partes da minha pobre cabecinha.   

Umas me diziam “você tem sorte, eu os tenho desde os 25 anos”.

Outras “são poucos ainda, precisa ver os meus, já tomaram tudo”.

Fiquei assim, nessa luta injusta durante quase um ano, acho. Firme em não me deixar vencer por eles, e continuar sendo exatamente quem eu era, sem alterações químicas... sem tintas rejuvenescedoras, sem disfarçar os anos.

Mas, confesso que aos 37 aqueles poucos fios pratas me incomodavam mais do que as famigeradas estrias ou celulites.

Chegou o dia, decidi me livrar deles radicalmente. Apelar para aquela medida drástica que eu tentava adiar ao máximo.

Pouco experiente no ramo, comprei um produto fiel às minhas madeixas: castanho escuro. E lá vou eu para a atrapalhação geral. Na hora de misturar a guloseima toda, pobre do meu banheiro, das paredes, pia, chão e toalhas. Tudo castanho escuro...

O pior não foram os elementos externos. Eu mesmo estava toda castanha escura, só escaparam as mãos, protegidas por providenciais luvas cedidas pelo fabricante. Porém, rosto, braços, pescoço, até pernas ficaram manchados.

Pânico geral, a bucha com sabonete foi a primeira coisa que avistei para começar a me esfregar inteira... Achei que aquela coisa não sairia nunca mais, e eu iria ter que andar de burca o resto da minha vida.

Verdade que não saíram rápido, mas foram saindo... para a minha salvação e do meu corpo, já imaginando-se fechado em roupas longas e só os olhos de fora no verão escaldante que tem feito em São Paulo.

Bom, passados os minutos de praxe, chuveiro e espelho. Achei que estavam um pouco mais pretos que o normal. Mas, ao esperar secar, o choque: Pretos? Estou a própria Mortiça da Família Adams.

Mas me conformei logo - porque sou daquelas que sempre vêem o lado bom das coisas, até nas piores desgraças - melhor assim do que loira, como dizem que é o destino de todas nós. Isso não, nunca!

Agora é só esperar as 28 lavagens para tudo voltar ao normal... e eu ter que encontrar outra solução para esconder aqueles insensíveis e irritantes fios levemente prateados que insistem em me lembrar que já não sou uma adolescente.